Responsabilidade e Vitimismo

Responsabilidade advém do latim responso (respõsum) que significa responder por.  Somos responsáveis quando respondemos por nossos atos, sentimentos ou por algo que nos foi  confiado.  Vítima vem a ser qualquer pessoa que sofre dano ou prejuízo – a quem o ato de ter sido prejudicada é atribuído como de responsabilidade de terceiros. Somos vítimas quando sofremos e atribuímos nosso sofrimento a alguém. Alguém é culpado por nosso sofrimento.

Ao não respondermos por nossos sentimentos e ações,  jogamos a responsabilidade no outro. Isto leva ao sentimento de vítima. E aí dizemos ao mundo – veja o que ele fez comigo! Sentir-se vítima sempre vem acompanhado pela culpa e acusação. Vitimismo e culpabilidade são suas faces da mesma moeda.

Muitas vezes, a acusação é uma falta de responsabilidade com a própria vida. Acusamos o outro por nos sentirmos de determinada maneira. Esta é uma concepção de mundo em que o foco está no exterior. Cremos que é o mundo externo direciona nossa vida. Eu diria que esta  concepção de mundo não se restringe apenas a eventos negativos – nosso foco está fora, sempre achamos que são acontecimentos ou pessoas externas a nós que nos fazem sentir alegres ou tristes.

Quando mudamos o foco do externo para o interno, reconhecemos que nós temos o poder de escolher como reagir, qual sentimento ter em relação ao evento. Ao nos darmos conta de que somos nós os ‘construtores’ de nossa vida, tomamos o poder em nossas mãos,  nossos estados de espírito não ficam  mais dependentes dos outros.

Responsabilidade é o oposto do vitimismo. Quando somos responsáveis somos poderosos, temos o poder em nossas mãos, quando projetamos e acusamos  somos vítimas,  marionetes nas mãos dos outros.  Não assumir a responsabilidade por nosso ser, necessariamente se desdobra em acusar o outro.

 

Reiterando, quando acusamos o outro  não estamos respondemos por nós, posto que cremos que o outro é o causador de nosso sofrimento.  Nesta concepção,  o outro é que é o responsável pelo que estamos sentimos ou pela experiência que estamos vivenciando. ‘O outro é que é o responsável’, leia-se: culpado.

Jake Eagle, psicoterapeuta e escritor norte-americano, nos ajuda a entender esta relação. Ele afirma: the degree to which we don’t take responsibility is the degree to which we may victimize ourselves. When we experience ourselves as victims we make excuses and blame other people . Whenever we blame other people, we aren’t taking responsibility for our own experiences or our own feelings. Other people become a distraction so that we don’t have to examine our contribution to creating the mess we’re in.” (p.121)

Não é raro escondermos algo que não gostamos em nós mesmos. Então,  projetamos em alguém o modo como sentimos ou mesmo, como pensamos. A projeção é um modo de negar qualidades que não admitimos como nossas. É uma maneira de esconder-se.

É muito usual projetarmos falhas, culpas nos outros. Ao lançarmos  a culpa em outra pessoa, nós fugimos de nós. Trata-se de uma forma de não assumirmos a origem de determinados sentimentos,  por considerá-los negativos. Assim, não temos vergonha de dizemos: estou com irritado por causa dele (a).

Portanto, a projeção acontece quando não assumimos nosso ser, nossas qualidades e defeitos. É uma irresponsabilidade quanto aos nossos atos e sentimentos. Não aceitamos, negamos, lançamos para fora. Não respondemos às nossas emoções como sendo nossas. Deste modo, somos irresponsáveis.

Assim,  projetamos a causa de nossos sentimentos no outro. Fazemos isto sem nos dar conta. Ao agirmos desta maneira,  ficamos mais longe de nosso próprio ser, nos alienamos de nós. E, também, perdemos a capacidade de estabelecer uma ligação com o outro.  A projeção instiga a separação, nos impede de nos conectar com o outro, pois quando projetamos uma qualidade negativa, nos afastamos das pessoas a quem atribuímos falhas, a quem consideramos estarem errados.

Não assumir a responsabilidade por nossos sentimentos é um caminho mais fácil,  porque é difícil aceitar sentimentos ruins como nossos. Sentimos raiva e justificamos nossa raiva afirmando que  foi o outro que nos fez ficar com raiva. Dizemos: ‘estou com raiva por causa de fulano, ou porque tal coisa nos aconteceu’.  A acusação é uma maneira de justificar a própria raiva. – Nós nos desapropriamos de nosso sentimento.

Relacionamentos saudáveis requerem autoconhecimento. Se não formos profundamente conhecedores de nossos sentimentos e necessidades, vamos projetá-los nos outros, gerando conflito e afastando-nos deles. Precisamos estar alertas para nossas experiências internas a fim de mantermos relacionamentos mais harmoniosos.

Isto leva à questão da honestidade. É conosco que precisamos ser honestos: quais são nossos valores, desejos, sentimentos e necessidades. Quando estamos conectados conosco, facilmente nos conectamos com os outros. Quando não reconhecemos nossos sentimentos como nossos e quando não reconhecemos nossas necessidade, projetamos os sentimentos e acusamos o outros por nosso sofrimento. Jake Eagle afirma que quanto mais estivermos desconectados de nós mesmos, mais sofremos ( ‘ …the longer I say disconnected from myself, the more I will suffer. p.118)

É comum pensarmos que honestidade consiste em dizer ao outro o que o outro é. Mas isto é uma impossibilidade. Tudo o que sabemos dos outros são nossas interpretações, nossas percepções. Houve um evento muito interessante no workshop: uma pessoa disse para outra: – você fala muito baixo. Dr. Jake interveio: – diga o que você precisa, não o que o outro é. Daí ela refez a frase: tenho necessidade de que fale mais alto.

Esta passagem foi muito esclarecedora. Usualmente, esquecemos de nós e nos referimos ao mundo externo. Assim, ficamos desconectados de nossas necessidades e sentimentos e, em vez disso,  somos condicionados a nos focar no outro. Isto sempre acontece através do julgamento, geralmente manifesto por meio de acusações.

Livrar-se do julgamento  nos leva a nos conectar com nosso próprio ser. Além disso, outro aspecto relevante  na relação julgamento/honestidade é que,  para Eagle, se nos desvencilharmos dos rótulos bom/mau, será mais fácil sermos honestos, pois estaremos livre do medo do julgamento (nosso e de outrem) o que facilitará o encontro conosco, ou a honestidade.

Considero honestidade a capacidade de nos darmos conta de quais são nossos sentimentos, necessidades e valores por meio dos quais erigimos a imagem dos outros em nós. Num exemplo bem simples: em vez de dizer que o outro é agressivo, é honesto dizer que tal comportamento não atende às nossas expectativas, ou que ficamos magoados por algum gesto ou palavra dita. O mesmo gesto ou palavra pode não ter nenhuma repercussão negativa em outra pessoa.

Ao assumirmos a responsabilidade por nossa vida, deixamos de culpar o outro por nossas falhas ou por acontecimentos que consideramos desagradáveis. Isto fomenta a paz e favorece a conexão com as pessoas. Também,  invertemos o papel de vítimas para o papel de pessoas de poder. Temos o poder de escolher como nos sentir frente aos acontecimentos. Assumir a responsabilidade por nós, significa um maior conhecimento de si, de nossos estados interiores, nos livrando de rótulos como bom ou mal – o que sentimos é legítimo. E, neste processo ainda temos um mundo de possibilidade sobre o qual navegar. Isto é libertador.

 

 

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